Em meio à possibilidade de o Supremo Tribunal Federal (STF) voltar a ser palco do debate sobre a legalização do aborto noÂ
Prestes a ser encaminhada ao Supremo pelaÂ
"O fundamento principal de nossa defesa nesses casos é o direito à saúde e à dignidade da mulher e o direito ao planejamento reprodutivo", esclarece a antropóloga Debora Diniz, pesquisadora e
Para o juiz do Tribunal de Justiça do Distrito Federal Álvaro Ciarlini, aÂ
"Estamos dispostos a pagar o preço do alargamento das hipóteses para aborto em casos de crianças que apresentem algum comprometimento neurológico? É a lógica da eugenia"
Na contramão, o coordenador do Centro de Justiça e Sociedade da FGV Direito Rio, Michael Mohallem, acredita que há, sim, espaço para o Supremo adotar a decisão para casos de fetos anencéfalos como precedente para a microcefalia associada à epidemia de zika. Para ele, o tribunal tem ressaltado em decisões recentes a importância de valores como o direito à privacidade e à autonomia. Costuma-se ainda usar como parâmetro legislações liberais de países considerados desenvolvidos, especialmente daqueles onde o aborto para todos os casos já realidade, como Reino Unido, Canadá e França.
"No caso do vírus zika, não há 100% de certeza sobre impossibilidade de vida, mas há alto custo emocional para a mãe e pode caber a ela descontinuar a gravidez para evitar sofrimento. Proteção à vida não significa apenas proteger contra a morte, mas dar condições de vida digna", diz Mohallem.
Não existe regra para definir quais casos são ou não julgados pelo STF e a pressão pública pode agilizar a discussão. Para Mohallem, prevalece o poder de agenda e a sensibilidade do presidente para definir quais assuntos são mais relevantes:
"Se o STF não quiser adotar a ampliação de seu próprio precedente de 2012, ele pode adotar uma nova linha de interpretação, a da omissão estatal. A mulher não pode ter a responsabilidade de carregar o ônus da omissão do Estado, que não cumpriu obrigação de evitar a epidemia"
Debora Diniz, da Anis, também vê negligência na atuação do Estado pela "incapacidade de exterminar o Aedes aegypti nos últimos 30 anos".
"Por mais que o zika seja um vírus recente no Brasil, o descaso em conter seu vetor já é suficiente para caracterizar negligência do Estado", diz a antropóloga.
Para Ciarlini, o argumento não é consistente: o Estado não responde pela situação endêmica, pois não estaria demonstrado que o Brasil poderia ter erradicado o mosquito se tivesse tomado outras providências.
Carlini também argumenta que o Supremo deve se debruçar apenas sobre casos para os quais as normas jurídicas não apresentam uma solução. Não haveria respaldo para uma alteração tipicamente legislativa. Caberia ao Congresso tomar a decisão a partir do debate "completo" e "adequado" na esfera pública.
"É pouco provável que o STF vá errar nessa questão. Ser mais ou menos conservador não dá ao STF o poder e legitimidade para a exclusão de licitudes. Ele deve cumprir a Constituição e garantir a separação entre os poderes", conclui o juiz.
Fonte: 180 Graus