As duas principais culturas produtivas do semiárido nordestino, a de milho e a de feijão, foram extirpadas pela seca deste ano –que já é considerada a mais rigorosa em décadas. A colheita de milho seria feita em maio, mas nem chegou a ser plantada, assim como o feijão.
Os pequenos produtores amargam prejuízos e veem as sementes permanecerem estocadas, sem condições de plantio. Nas cidades, a consequência da crise no campo é a alta dos preços, com alimentos custando mais que o dobro em relação ao ano passado.
Um exemplo está no feijão carioca, item essencial da cesta básica. O quilo do alimento, que até o final do ano passado custava, em média, R$ 2,50 nos mercados, hoje está entre R$ 5,50 e R$ 6. O preço pode aumentar ainda mais, caso não chova nos próximos meses.
Já o saco de milho (correspondente a 50 espigas), vendida nos mercados públicos, custava entre R$ 12 e R$ 15 nas capitais do Nordeste e hoje está entre R$ 25 e R$ 30. No Nordeste, o tradicional milho usado nas festas juninas está sendo “importado” de outras regiões.
Segundo o presidente da Associação de Supermercados de Alagoas, Raimundo Barreto, com a escassez na região, a solução é buscar o feijão em outras regiões. "Todo esse feijão que estamos vendendo aqui, na capital [Maceió], vem do Sul, especialmente do Paraná. E lá, pelo que sei, houve geadas, que também prejudicaram a produção. Há pouca oferta no mercado. Quando a gente tem um oferta pequena, o preço sobe. É a lei natural do comércio", alega.
Barreto conta que a produção existente nas cidades que não estão sofrendo com a seca do Nordeste é incapaz de abastecer o mercado interno. "No interior ainda temos alguns mercados comprando desses produtores locais, mas que têm pouca oferta e só abastecem pequenas cidades. O Nordeste sempre exportou feijão para o Sul, mas, com a seca, nós é que estamos comprando deles. Essa situação é sazonal. Quando a oferta voltar a crescer, o preço cai de novo.”
O preço do feijão vem subindo não só Nordeste, mas em todo o país. Segundo o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Econômicos), em abril o preço subiu em 14 das 17 capitais pesquisadas quando comparado com o mês anterior –com destaque para a alta em Fortaleza (19,52%) e São Paulo (13,56%).
Segundo a pesquisa, em um ano foram registrados aumentos significativos no preço do feijão em todas as capitais brasileiras. Em Belém, por exemplo, foi registrada a maior alta, de 121% em 12 meses. Recife (70,67%), João Pessoa (69,78%) e São Paulo (67,21%) apresentaram, em seguida, as maiores altas.
“Há um ano, os preços do feijão estavam bem mais baratos e os produtores reduziram as áreas de plantio. Os preços subiram e, para tanto, contribuiu também a seca que prejudicou as safras seguintes, em especial em Irecê, grande produtora de feijão na Bahia. Como os preços estão elevados, é possível que o plantio volte a crescer o que pode permitir a redução subsequente nos preços, principalmente se não houver novo período de seca”, explicou o Dieese.
Durante visita ao semiárido de quatro Estados nordestinos, ouvimos relatos dos agricultores que foram unânimes: em 2012, ninguém plantou –com exceção das pouquíssimas áreas irrigadas.
“Mas essas áreas irrigadas não correspondem sequer a 5% do total da produção. O milho do São João vai ter que vir de fora”, explica o coordenador da Defesa Civil de Poço Redondo (SE), José Carlos Aragão.
Muitas localidades estão com as terras aradas (ou seja, preparadas para o plantio), mas a falta de água impediu qualquer tentativa. Um dos que preparou a terra foi o agricultor Pedro Alexandre, 61, que não esconde a frustração com a falta de chuvas. “Todos os meses de abril e maio a gente planta. Ano passado plantei, mas como não choveu, perdi tudo. Esse ano nem plantar plantei. Está todo mundo parado, e acho que esse ano está tudo perdido.”
No assentamento Caiçara, ligado ao MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), já próximo à divisa de Sergipe com a Bahia, os pequenos produtores também relatam prejuízos com a produção, mas ainda acreditam que a chuva virá.
“Aqui plantamos para consumo nosso. Mas esse ano não teremos nenhum caroço de feijão ou de milho. Pra gente é ruim demais. Vivemos da ajuda do governo [pelo programa Bolsa Família], e nosso complemento era essa plantação, que não veio por conta dessa seca. Mas tenho fé que ainda vai chover e vamos plantar”, contou o agricultor Severino Ramos, 69.
Em Glória (BA), a situação é a mesma. “Tudo está perdido este ano, não tem mais jeito. Agora, é esperar o próximo ano. Para esse, não acredito mais em chuva” relata Lourenço Félix Araújo, 68.
Para ajudar os produtores que perderam as produções, o governo federal anunciou a antecipação do Garantia Safra, no valor de R$ 680. Além disso, as famílias de áreas afetadas vão receber o bolsa estiagem, no valor de R$ 400, divididos em cinco parcelas de R$ 80.
Fonte: UOL