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Cajuína do Piauí protege DNA humano, diz pesquisa

08/12/2013 | Edivan Araújo
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Quem mora no Piauí ou costuma visitar o Estado certamente já provou a cajuína – bebida não alcoólica feita a partir do suco de caju e que faz parte da cultura local, compondo a identidade piauiense.

Além de desfrutar do sabor e das qualidades nutricionais já comprovadas (o produto é boa fonte de vitaminas C a A), um fato que pouca gente conhece é que, quem bebe um bom copo gelado de cajuína está também ajudando a proteger a saúde.

É o que apontam os estudos da pesquisadora Ana Amélia de Carvalho. A professora (doutora em Biologia Molecular) faz parte do quadro permanente do Mestrado em Ciências Farmacêuticas da UFPI (Universidade Federal do Piauí), sendo também colaboradora da Ulbra (Universidade Luterana do Brasil) e do Centro Universitário Uninovafapi, em Teresina.

Bebida melhora os efeitos de medicamentos

Já na UFPI, as referidas pesquisas tiveram um novo passo ao ingressar nos testes em seres vivos - mais especificamente em camundongos. Os resultados foram similares aos percebidos nas testagens em bactérias e também apresentaram conformidade com os estudos in vitro, reforçando a caracterização do poder antioxidante da cajuína.

Nesse ponto, foi observado que a bebida piauiense pode "sequestrar" radiciais livres gerados por uma droga chamada ciclofosfamida, que é um antineoplásico bastante usado na quimioterapia.

Os novos testes geraram conclusões ainda mais solidificadas. Nas palavras da pesquisadora: "Ao aplicar a ciclofosfamida em conjunto com a cajuína em camundongos, notamos que o produto natural foi determinante para combater os danos induzidos pela droga ao DNA, a exemplo de danos oxidativos, que é um mecanismo necessário para destruir as células neoplásicas.

Ou seja, a cajuína impede que o medicamento tenha uma ação oxidante, diminuindo seu efeito. Portanto, durante uma quimioterapia, não é recomendado ao paciente ingerir produtos antioxidantes, sob pena de afetar a efetividade do tratamento".

Ainda na UFPI, no curso de Ciências Farmacêuticas e no Departamento de Biologia, em colaboração com a Dra.

Sandra Maria Mendes de Moura Dantas (UFPI), Dra. Juliana da Silva e Dra Jaqueline Picada, ambas da ULBRA, foram feitos mais estudos com testes de aberrações cromossômicas, com o objetivo de observar se a cajuína impedia a ciclofosfamida de causar a quebra (alterações estruturais) dos cromossomos, comprovando que a bebida realmente tem uma proteção antimutagênica, conforme foi verificado anteriormente em bactérias.

Também foram feitas pesquisas com leveduras, com resultados parecidos - mais uma vez, as propriedades antioxidantes se apresentaram de forma bastante clara.

"Em suma, a cajuína, apesar de todo o processamento, constitui-se em um excelente produto antimutagênico, com grande capacidade de agir na redução de danos oxidativos.

Desta forma, deve fazer parte da dieta das pessoas como um composto natural capaz de proteger o material genético contra ação de compostos mutagênicos e carcinogênicos, o que também se constitui em uma postura de prevenção da formação de neoplasias (casos de câncer)", resumiu a pesquisadora.

Produto artesanal surpreendeu pesquisadores no Sul do país

Questionada sobre a reação dos pesquisadores da UFRGS diante da escolha das propriedades da cajuína como objeto de pesquisa em seu Doutorado, Ana Amélia de Carvalho ressalta que o produto, antes um ilustre desconhecido dos acadêmicos da instituição, acabou tornando-se uma grata surpresa para todos.

"A princípio eles ficaram assustados com a qualidade nutricional e funcional da cajuína. Mas meu orientador me deu total apoio", lembra ela, que hoje desenvolve diversas pesquisas nas áreas de Mutagênese e Cancinogênese.

Por enquanto, a cajuína ainda não dispõe de um padrão de qualidade no que diz respeito aos processos de fabricação do produto ao longo do território do Estado. Entretanto, a pesquisadora diz que isso foi levado em consideração em todos esses anos de estudos acerca da famosa bebida.

"Fiz pesquisas com produtos oriundos de diferentes pontos de produção artesanal e não observei variações químicas que implicassem alterações nas propriedades antimutagênicas e anticarcinogênicas", finaliza a professora Doutora.

Os trabalhos com a cajuína começaram durante o doutorado da pesquisadora, no laboratório de genotoxicidade da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Lá, em conjunto com o grupo de pesquisadores do Dr. João Antônio Pêgas Henriques, foram inicialmente testados o suco de caju e a cajuína em bactérias e também com o uso de metabolização, com o objetivo de simular efeitos em células eucarióticas.

Neste primeiro momento, as potencialidades do suco de caju e da cajuína já começaram a surgir: ambos apresentaram antimutagênicos nos testes iniciais, ou seja, mostraram-se capazes de modular a ação de drogas que são consideradas mutagênicas e carcinogênicas, a exemplo do benzo[a]pireno e da aflatoxina, bem como do peróxido de hidrogênio.

O passo seguinte foram os estudos e testes in vitro. Nestes testes, foram encontrados altos potenciais antioxidantes na cajuína e no suco de caju. “Fato que nos surpreendeu muito, porque quando se faz a análise dos constituintes químicos da cajuína e do suco de caju, encontra-se no suco um percentual muito alto de vitamina C, além de compostos flavonoides e taninos condensados.

Na cajuína, o total de vitamina C e desses mesmos compostos é diminuído em virtude de todo o processo de fabricação ao qual o produto é submetido. No entanto, mesmo depois de passar por todos esses processos, a cajuína se mostrou muito mais antioxidante que o suco de caju”, explica a pesquisadora.

Isso provou que alguns compostos que foram degradados durante o aquecimento e as demais fases de fabricação da cajuína acabaram se transformando em outros compostos, caso do ácido gálico e do ácido elágico, que são excelentes compostos antioxidantes - capazes de “sequestrar” radicais livres (moléculas liberadas pelo metabolismo do corpo com elétrons altamente instáveis e reativos, que podem causar doenças degenerativas, envelhecimento e morte celular, além do câncer).

“Essa propriedade da cajuína é benéfica para o organismo, afinal, por dia, só com a metabolização do peróxido de hidrogênio, acontecem cerca de 10 mil lesões oxidativas ao DNA.

É o chamado ‘stress oxidativo’, que hoje é tido como uma das principais etiologias para o envelhecimento e para o desenvolvimento de câncer”, complementa Ana Amélia.

FONTE: Dowglas Lima

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