Talvez Maurício* estivesse com as mãos trêmulas e o coração incontrolavelmente acelerado naquele dia 29 de dezembro de 2015. Era uma terça- -feira, que podia ser como todas as outras, não fosse o fato de que, naquele dia, o jovem de 17 anos tivesse escolhido para fazer seu primeiro assalto. Na companhia de um amigo, Maurício cometeu roubos a transeuntes e, no mesmo dia, foi apreendido pela Polícia pela prática dos delitos. Apesar do crime, a história do jovem, como a de todos, vai muito além do dia em que ele ganhou uma ficha na Polícia.
Maurício é o mais novo de quatro irmãos. Quando chegou aos seis meses de vida, o pai e a mãe se separaram, exigindo que a matriarca cuidasse de todos os filhos frutos da união. Sem possibilidades financeiras, a mãe do garoto teve que abrir mão do filho mais novo e o ofertou para a adoção.
Acompanhando a situação, dona Márcia* ficou sensibilizada pela história e trouxe o bebê para o seu seio familiar. Mãe de outros quatro filhos maiores, Márcia afirma ter integrado Maurício como um ‘filho de sangue’. “A gente nunca teve condições, mas eu vi a situação dele, que ninguém queria ficar porque era muito fraquinho e mal cuidado. Cuidei dele como um filho de sangue e, dentro das minhas condições, fiz tudo que pude”, explica.
Maurício cresceu na periferia da zona Leste de Teresina, no bairro Anita Ferraz, e Márcia conta que, até os 13 anos, o garoto era obediente e muito carinhoso. Com a adolescência, muitos problemas começaram aparecer, entre eles, a rebeldia e mau comportamento.
“Ele começou a dizer que ia para a escola, mas não ia. As companhias eu já não aprovava mais e começou a me responder por tudo”, conta. Márcia tinha conhecimento que o filho usava drogas, mas os pedidos para que parasse com o hábito eram respondidos com a negativa de que não era um dependente.
Maurício parou de estudar na sétima série e, no fim do ano passado, praticou seu primeiro delito. Hoje, o jovem está recolhido no Centro Educacional de Internação Provisória (Ceip), onde cumprirá mais 45 dias de internação.
Na última visita, Márcia conta que o jovem se mostrou arrependido e prometeu não reincidir no erro. “A primeira vez que eu fui lá, ele só chorou. Não disse uma palavra. Da última, j á conversou e prometeu que nunca mais fará isso. Muito mais devastada que ele estou eu, me pergunto onde errei, o que fiz para isso acontecer. Mas a gente não pode controlar tudo. Eu só quero que ele nunca mais faça isso”, finaliza
Prisões versus efetividade do sistema
Supõe-se que uma ordem de prisão deva ser dada quando o indivíduo pratica algum ato criminoso em sociedade. Assim, afastá-lo do convívio social e prepará-lo para a reinserção contribuiria para a paz social. O que deveria ser regra, na verdade, é exceção. Para o comandante-geral da Polícia Militar do Piauí, coronel Carlos Augusto, ao passo que a Polícia age efetuando prisões de pessoas envolvidas com atos criminosos, há um lacuna na proporção de como esses indivíduos são julgados e iniciam o cumprimento da sua pena.
“A missão constitucional da Polícia Militar é ostensiva e preventiva. Mas se faz segurança apenas com o trabalho da Polícia Militar? Claro que não. A segurança pública é feita por um sistema bem pensado onde tem Polícia Militar, Polícia Civil, Ministério Público, Poder Judiciário e Sistema Penitenciário. Nós temos um sistema penitenciário em nível nacional lotado e vale lembrar que mais de 60% dos presos do Piauí são presos provisórios, o que quer dizer que tem alguma questão a ser resolvida dentro do sistema, dentro do sistema de segurança, nós estamos com todas as penitenciárias abarrotadas e isso prejudica o nível de segurança da cidade”, esclarece.
Os dados usados pelo comandante constam no último relatório do Cadastro Nacional de Inspeções nos Estabelecimentos Penais (CNIEP), divulgado mensalmente pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que aponta que 62% da população carcerária do Piauí correspondem a presos provisórios, ou seja, 2.270 estão dentro do sistema penitenciário ainda aguardando julgamento.
“Eu vejo que é preciso deixar preso quem realmente deva estar fora do convívio em sociedade; os homicidas, estupradores e traficantes não podem estar nas ruas. Nós prendemos essas pessoas reiteradas vezes. Esse ano, prendemos um cara acusado de oito homicídios, nós tivemos um policial morto ano passado por um menor e três meses depois encontramos ele nas ruas, solto. Isso dá esse sentimento de impunidade, como não há julgamento, os presos retornam para as ruas”, destaca o coronel Carlos Augusto.
Segundo o comandante, os pequenos furtos representam um dos principais problemas enfrentados na Capital. Ele acredita existir cerca de 3 mil pessoas, atuando no Estado na prática de crimes, vinculadas, principalmente, ao uso de drogas.
“Quando se tem essa sensação de insegurança, a primeira que apanha é a Polícia, mas temos feito um trabalho de reestruturação muito grande e tido o reconhecimento da população. O problema é que, nos pequenos furtos, a droga é a grande aliada e ela está em todos os municípios do Brasil. Essas pessoas não precisam necessariamente estar presas, mas sendo tratadas. Com a saúde pública, funcionando nesses casos, nós teríamos um desafogamento nos presídios”, finaliza.
Fonte:Jornal O Dia