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Promotoria pedirá revisão da decisão que suspendeu depoimento de Lula

Para promotor, decisão do CNMP 'prejudica trâmite da investigação'. Liminar suspendeu depoimentos de Lula e Marisa sobre triplex.

17/02/2016 | Edivan Araujo
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O promotor Cássio Conserino, que tomaria o depoimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesta quarta-feira (17) sobre um triplex no Guarujá, afirmou que pedirá revisão da decisão que suspendeu a declaração de Lula e de sua mulher Marisa Letícia.

Para Conserino, a decisão do CNMP "prejudica o trâmite da investigação criminal".

"Quanto à alegada prevenção desta investigação criminal com investigação anterior mencionada na decisão do CNMP, os promotores de justiça ressalvam, com veemência, que o ilustre conselheiro do CNMP certamente foi induzido em erro pelo DD", diz nota lida pelo promotor Cássio e assinada por mais três promotores.

O procurador-geral de Justiça, Márcio Fernando Elias Rosa, também se manifestou nesse sentido e divulgou nota afirmando que a Constituição reserva ao CNMP a fiscalização do Ministério Público no âmbito administrativo. 

"Compreende que a Constituição ao reservar ao CNMP o controle externo quanto à atividade administrativa do Ministério Público, exclui de seu âmbito a interferência nas funções de execução, entendimento já consolidado no âmbito daquele próprio colegiado".

Liminar concedida na noite desta terça-feira (16) por um integrante do Conselho Nacional do Ministério Público suspendeu a audiência marcada para ouvir Lula e Marisa Letícia sobre o apartamento tríplex no edifício Solaris, no Guarujá, no litoral de São Paulo.  A decisão liminar, que se aplica também a mulher do ex-presidente, vale até que o plenário do Conselho Nacional do Ministério Público analise o caso.

Na nota lida por Cássio Conserino e que é assinada também pelos promotores Fernando Henrique Araújo, José Reinaldo Carneiro e José Carlos Blat, os promotores afirmaram que a investigação respeita as regras do próprio CNMP.

Ele cita o artigo terceiro da Resolução n 13/06, que prevê que o procedimento investigatório criminal poderá ser instaurado de ofício por qualquer meio pelos membros do Ministério Público, que poderão prosseguir à frente do procedimento "até a distribuição da denúncia ou promoção de arquivamento em juízo". A afirmação é uma resposta à alegação feita pelo deputado Paulo Teixeira de que houve violação do princípio do promotor natural na investigação em questão.

Os promotores encerraram a nota afirmando que a ação envolve pessoas que "se consideram à margem da lei".

"Portanto, os promotores de justiça condutores da presente investigação criminal levarão tais informações e documentos ao CNMP, a fim de obter urgente revisão e reversão da decisão preferida, para que posssam cumprir o objetivo de apurar os graves fastos envolvendo pessoas que se consideram acima e à margem da lei, algo que não pode ser subtraído da honesta sociedade civil brasileira", diz a nota.

'Autoridade competente'

 Lula afirmou a deputados do PT na manhã desta quarta-feira (17) que quer dar explicações à autoridade competente, e não ao promotor Cássio Cesarino. O ex-presidente se reuniu com 21 deputados federais petistas no Instituto Lula, na Grande São Paulo.

"Este promotor não tem a competência para esta investigação, ele quis fazer esta investigação e deveria ter distribuído esta investigação para um dos seus 120 colegas e aquele que fosse sorteado, aquele sim teria a competência. Ele de uma maneira precipitada iniciou a investigação que não cabia a ele. O presidente está disposto a estar prestando todas as informações, mas para a autoridade competente, não para alguém que se coloca enquanto tal mas nao é", disse o deputado Paulo Teixeira (PT-SP).

"O estado democrático de direito não pode autorizar pessoas a usurpar competências de outras, a agir fora da lei. É um caso típico de alguém que está agindo fora da lei", complementou.

Os deputados se reuniram no Instituto Lula em ato de desagravo ao promotor que intimou Lula a depor.

"O Conselho Nacional do MP foi criado para evitar abusos da instuição e aquele membro que praticar algum abuso deve ser contido e o Conselho conteve este abuso que estava sendo cometido por este promotor", disse Teixeira.

"Ele, por razões que eu desconheço, de uma maneira precipitada, quis ele mesmo fazer uma investigação que não competia a ele".

Para Paulo Teixeira, o promotor deveria ter comunicado o fato aos promotores que já jnvestigam casos da Bancoop e ter aceitado a distribuicao entre seus colegas do caso.

"O promotor tem uma motivação, ele quis fazer algo que ele não poderia fazer. Tanto é assim que o CNMP decidiu paralisar as oitivas até o pleno decidir a continuidade da investigação. Esta investigação vai continuar, ninguém quer paralisar a investigação, ela vai continuar com a autoridade certa e competente", afirmou Teixeira.

Protesto

O cancelamento do depoimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva  não evitou que grupos se concentrassem na frente do Fórum Criminal da Barra Funda cedo pela manhã para expressar seu apoio ou suas críticas ao ex-presidente.

Centenas de pessoas ligadas à CUT ou ao PT participam do protesto pró-Lula. Um grupo de cerca de 25 pessoas, parte delas filiadas ao PT, veio do Rio de Janeiro para apoiar o ex-presidente. Com camisetas com frases como "Lula presidente" e bandeiras do PT, eles cantavam em apoio ao ex-presidente: "Lula, guerreiro, do povo brasileiro".

Um dos manifestantes, José Ribamar Dadinho, afirmou que o grupo já sabia do cancelamento, mas decidiu fazer a viagem para apoiar. "O presidente é a maior figura do país. Os outros países sabem preservar, mas o Brasil não está sabendo. Não havia necessidade de depoimento. Está se criando um clima de insegurança jurídica", afirmou José Ribamar. Ele diz ainda que a oposição tenta criar um terceiro turno por ter perdido a disputa eleitoral em 2014. Outros manifestantes pró-Lula carregam bandeiras da CUT (Central Única dos Trabalhadores).

A poucos metros, pessoas com a bandeira do Brasil apoiavam a investigação e também mantiveram o protesto em frente ao fórum. Nas faixas, carregavam dizeres como "Somos Todos Sérgio Moro, em alusão ao juiz da Operação Lava Jato. Outros pediam intervenção militar. A corretora Janda Ribeiro afirma ser a favor da prisão de Lula é que só o fato de ele ter sido convocado para depor já é um marco. Ela pede a cassação do cargo de todos os políticos envolvidos em corrupção, independentemente do partido. Outro manifestante, o aposentado Edilson Coelho, opinou que a investigação em relação ao triplex do Guarujá é só início. "É só a ponta do iceberg. O PT quebrou o Brasil. E o sítio de Atibaia? E a antena exclusiva?", questionou.

O blog do Noblat, do Jornal "O Globo", divulgou na manhã desta quarta-feira (17), que o amigo de Lula, o ex-sindicalista José Zunga Alves de Lima foi o responsável por conseguir a instalação de uma antena de celular da Oi próxima ao sítio da família Lula em Atibaia, interior de São Paulo, em 2010. A antena da operadora de celular seria um presente dado a Lula por Otávio Marques de Azevedo, presidente da AG Telecom, uma das controladoras da Oi e parte do grupo Andrade Gutierrez.

Por volta das 8h40, manifestantes contra e a favor de Lula invadiram duas faixas no sentido Centro da Rua Abrahão Ribeiro e bloquearam o trânsito da via em frente ao fórum.

Cerca de cinco minutos depois, os grupos foram separados por gradis. Por volta das 9h20, o número de manifestantes favoráveis a Lula aumentou. Um carro de som apoia os manifestantes.

Liminar

A liminar foi concedida pelo conselheiro Valter Shuenquener de Araújo, a partir de pedido de providências  apresentado pelo deputado Paulo Teixeira (PT-SP), que invocou a violação do princípio do promotor natural, uma vez que a ação relativa à Bancoop, cooperativa que inicialmente construiu o prédio de apartamentos no Guarujá, estava na 5ª Vara da 1ª Promotoria de São Paulo, enquanto o procurador Cássio Cesarino, que convocou Lula para o depoimento, é integrante da  2ª Vara.

"Não é recomendável a manutenção de ato a ser presidido pelo requerido designado para amanhã [quarta-feira] sem que antes o Plenário deste Conselho possa apreciar as alegações de ofensa ao princípio do Promotor Natural no âmbito do Ministério Público do Estado de São Paulo. A manutenção do ato poderia, acaso se entenda, em momento futuro, pela falta de atribuição do referido membro e da necessidade de livre distribuição do feito, até mesmo ensejar uma indesejável nulidade no âmbito penal", afirmou o conselheiro na decisão.

O conselheiro entendeu que há "fumaça do bom direito", ou seja, motivos para suspender temporariamente os atos do promotor em razão de suspeitas. A liminar concedida suspende todos os atos praticados pelo promotor na investigação até que o plenário do conselho análise o caso. O conselheiro também determinou que a Procuradoria de Justiça de São Paulo seja intimada com urgência da decisão.

O deputado Paulo Teixeira disse ter tomado a iniciativa de questionar o pedido do promotor Cássio Cesarino de convocar o ex-presidente Lula a prestar depoimento perante o Ministério Público de São Paulo por considerar que o promotor, em entrevista há mais de uma semana, acabou por expor antecipadamente o seu ponto de vista. E, ainda, por considerar que o promotor extrapolou ao tratar, além do apartamento triplex no Guarujá, também fazer referências ao sítio em Atibaia, frequentado pelo ex-presidente e sua família.

Ele disse que não vai repetir o questionamento em relação à convocação do ex-presidente Lula a prestar depoimento perante o juiz Sérgio Moro, o que está marcado para o dia 14 de março, por teleconferência. "Este papel é dos advogados do ex-presidente; só tomei esta iniciativa agora porque é caso da promotoria de São Paulo", disse o deputado.

Imóvel no Guarujá

Em janeiro, o promotor Conserino afirmou que há indícios de que houve tentativa de esconder a verdadeira identidade do dono do triplex e  que essa seria uma forma de encobrir o crime de lavagem de dinheiro. Os promotores suspeitam que a OAS, que assumiu a obra com a falência da Bancoop, reservou o imóvel para o ex-presidente Lula e sua família.

Quando foi reeleito, em 2006, Lula apresentou na declaração de bens uma cota de um projeto da Bancoop em construção no Guarujá, no valor de R$ 47.695.

O ex-presidente da OAS José Adelmário Pinheiro, conhecido como Léo Pinheiro, também foi intimado e falará às 15h. Ele já foi condenado a 16 anos na Operação Lava Jato, recorreu e responde em liberdade. Mais tarde, às 17h, é a vez do engenheiro da OAS Igor Pontes prestar depoimento sobre o caso.

O G1 questionou a posição da construtora sobre os depoimentos e não obteve retorno até a publicação desta reportagem. Em janeiro, a OAS afirmou que não se posicionaria sobre a investigação em andamento.

Suspeitas infundadas, diz instituto

Em nota divulgada em janeiro, o Instituto Lula disse que "são infundadas as suspeitas do Ministério Público de São Paulo e são levianas as acusações de suposta ocultação de patrimônio por parte do ex-presidente Lula ou seus familiares".

"Lula e sua esposa Marisa Letícia nunca esconderam que ela adquiriu, em 2005, uma cota da Bancoop, paga em prestações mensais, que foi declarada no Imposto de Renda. Mas nunca foram proprietários de apartamento em qualquer condomínio da Bancoop ou de suas sucessoras. A verdade ficará clara no correr das investigações."

O instituto afirmou, em outra nota, que os advogados do ex-presidente examinavam também "medidas que serão tomadas diante da conduta irregular e arbitrária do promotor Cássio Conserino. O promotor violou a lei e até o bom senso ao anunciar, pela imprensa, que apresentará denúncia contra o ex-presidente Lula e sua esposa, Marisa Letícia, antes mesmo de ouvi-los. E já antecipou que irá chamá-los a depor apenas para cumprir uma formalidade".

"Ao contrário do que acusa o promotor – sem apresentar provas e sem ouvir o contraditório – o ex-presidente Lula e sua esposa jamais ocultaram que esta possui cota de um empreendimento em Guarujá, adquirida da extinta Bancoop e que foi declarada à Receita Federal. O capital investido nesta cota pode ser restituído ao comprador ou usado como parte na aquisição de um imóvel no empreendimento", afirma a nota.

"Nem Lula nem dona Marisa têm relação direta ou indireta com a transferência dos projetos da extinta Bancoop para empresas incorporadoras (que são várias, e não apenas a OAS). Não há, portanto, crime de ocultação de patrimônio, muito menos de lavagem de dinheiro. Há apenas mais uma acusação leviana contra Lula e sua família", diz a nota do Instituto Lula.

Fonte: G1

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