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Pedófilos de SP usam personagens infantis na Internet para aliciar crianças do PI

Constatou-se que meninas e meninos do Piauí têm sido vítimas em casos de pedofilia. E entram nas estatísticas de casos que mais crescem contra crianças e adolescentes.

19/03/2015 | Edivan Araujo
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Parece ser clichê recomendar para os responsáveis por crianças monitorarem cada vez mais o que filhas e filhos fazem na Internet. Mesmo assim, pedófilos têm usado cada vez mais a Rede Mundial de Computadores, e outros dispositivos modernos de Comunicação, para atacar e aliciar crianças.
Constatou-se que meninas e meninos do Piauí têm sido vítimas em casos de pedofilia. E entram nas estatísticas de casos que mais crescem contra crianças e adolescentes.

Pedófilos são pessoas desequilibradas que têm taras, geralmente sexuais, por crianças. É uma doença. A utilização do termo monstro lhes cai muito bem.

Está para estourar no Piauí um dos maiores casos de rede de pedofilia já descobertos. As investigações feitas por vários setores da Polícia Civil piauiense apontam, inclusive com identificação de identidade e endereço, para pedófilos do estado de São Paulo, precisamente para a capital paulista.

No caso em questão os acusados têm utilizado a Internet para aliciar crianças do Piauí, principalmente meninas.

Primeiro os pedófilos entram em sites e grupos de discussão de temáticas infantis e infanto-juvenis, geralmente personagens queridos e da moda. Fingindo ser da mesma idade (geralmente entre sete e dez anos), e até utilizando linguagem própria de meninas e meninos, começam a conquistar amizade e a ter contatos mais fraternais. Trocam inicialmente informações básicas, para depois tratar de assuntos mais pessoais. O caso em questão envolvia fãs dos personagensMonster High (com desenhos animados, jogos e infinidade de produtos infantis).

O segundo passo da rede de pedofilia, já com a confiança das vítimas, é convidar as meninas para conversas via imagens (geralmente webcams – câmeras de vídeo). É nesse passo que as crianças-vítimas, de maneira inocente, são convidadas a fazer gestos obscenos, poses constrangedoras e até a tirar a roupa.

Os atos são tidos como despropositados já que as meninas pensam estar papeando com amiguinhas, achando que estarão fazendo brincadeiras.

MATERIAL É REPASSADO PARA REDE DE PEDÓFILOS NO MUNDO

Todo esse material, segundo fonte da Polícia Civil do Piauí que investiga o caso desde o ano passado (e só revelou as informações sob condição de anonimato) termina sendo repassado em redes de pedófilos de todo o mundo. “Depois de cair em redes de pedófilos, que trocam esse material a toda hora, fica mais difícil de encontrar quem espalhou. Isso se torna viral”.

A preferência por crianças do Piauí é justamente pela pouca ou menor disseminação de práticas caseiras e escolares de prevenção à pedofilia. “É um território fértil para esse tipo de maníaco, pois qual pai ou mãe vai desconfiar que uma amiguinha, em um site infantil, é na verdade um pedófilo do outro lado do país que vai pegar aquela conversa, transformar em um aliciamento e espalhar fotos de sua filha”, indagou um dos policiais que investigam o caso.

MÃE MONITOROU FILHA EM TERESINA E FEZ DENÚNCIA DE PEDOFILIA

O esquema de pedofilia só veio à tona porque a mãe de uma das meninas vítimas, moradora de Teresina, começou a notar comportamentos estranhos da filha quando estava no computador utilizando a Internet. Os ataques ocorriam após interpelação em fórum sobre os personagensMonster High. A mãe decidiu monitorar os passos da filha e constatou que a mesma era vítima de pedofilia.

O caso foi comunicado desde o meio do ano passado à Polícia Civil. Houve investigação em três frentes, com a hoje chamada força tarefa informal contra a pedofilia, composta pela Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente – Vítimas – DPCA, o Greco – Grupamento de Repressão ao Crime Organizado, e o Setor de Inteligência. Os mesmos começaram a monitorar a rede de pedofilia com técnicas policiais avançadas e especializadas para o tipo de caso.

As investigações foram tão bem feitas que chegou-se ao líder da quadrilha de pedófilos em pouco tempo. O mesmo mora na cidade de São Paulo e sabe-se até o endereço de onde partiram os ataques às crianças do Piauí.

O caso continua sendo investigado porque o pedófilo ainda não foi preso.

E POR QUE O PEDÓFILO AINDA NÃO ESTÁ PRESO?

E por que esse maníaco não está atrás das grades? Essa foi a principal indagação feita pela reportagem de O Olho à fonte. Prontamente o questionamento foi respondido. Mesmo o pedófilo estando identificado, o crime não foi em flagrante e ele, líder do esquema, precisa ser ouvido para prestar depoimento para aí sim o inquérito ser concluído e a Justiça tomar providências de prisão.

A oitiva do pedófilo só é possível via carta-precatória, instrumento em que o acusado deve ser ouvido por um delegado da Polícia Civil de São Paulo, já que o mesmo reside fora do Piauí. Depois disso é que o material é enviado para o estado de origem do crime.

Mesmo depois de meses a carta-precatória de oitiva do acusado, enviada pela Polícia Civil do Piauí, ainda não foi executada pela Polinter (Polícia Interestadual de São Paulo).

“Isso é revoltante, porque fizemos a investigação, descobrimos o maníaco. Sabemos o endereço exato de onde partiam os atos e até descobrimos o carro dele, um Corolla, a casa dele, um sobrado de portão, mas não podemos atuar mais por causa disso. Lembrando que poderia ser com o filho de qualquer pessoa”, relatou o policial (um dos primeiros a investigar o caso), destacando que esse não é o primeiro do tipo, parado na burocracia policial de outros estados.

Algumas vezes os pedidos de oitivas chegaram a sumir e têm de ser refeitos, atrasando mais ainda as conclusões das investigações.

“No Piauí procuramos cumprir sempre as cartas precatórias, pois sabemos que monstros como esse não podem ficar soltos. Nesse momento ele deve estar fazendo mais vítimas”, relatou, em tom de revolta, o policial ouvido pela reportagem.

ESQUEMA DE PEDOFILIA ENVOLVENDO CRIANÇAS DO PIAUÍ É APENAS UMA DAS VÁRIAS REDES INVESTIGADAS NO ESTADO

O caso das crianças vítimas da rede de pedofilia envolvendo pessoas de São Paulo é apenas um dos atualmente investigados no Piauí.

Desde o início de 2015 casos de pedofilia são de responsabilidade da DPCA (Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente – Vítimas). Até o final do ano passado os casos eram de responsabilidade da Delegacia de Crimes Virtuais, que atualmente é um setor ligado ao Greco. Quando o assunto envolve pedófilos de fora do país ou esquemas com sites não sediados no Brasil são enviados para a Superintendência da Polícia Federal no Piauí.

Atualmente casos de pedofilia no Piauí são investigados pela DPCA, na zona Sul de Teresina. Foto: João Alberto / O Olho
Muitos dos casos em aberto ainda são do ano passado e poucos pedófilos foram presos justamente porque a maioria dos que atua em sistemas envolvendo Internet e dispositivos móveis (tablets e celulares) são de outros estados.

Os pedófilos piauienses agem mais com contato direto, geralmente abusando sexualmente de meninas e meninos em ambientes familiares e vizinhanças.

Há casos investigados no Piauí principalmente envolvendo o Whatsapp (programa de troca de mensagens, fotos e vídeos em celulares) e de intercâmbio de fotos de crianças pela Internet.

Até hoje somente um pedófilo foi condenado no estado.

Pelo Código Penal brasileiro os crimes de pedofilia são punidos pelo que rege a Lei 11.829/08 que prevê prisão de quatro a oito anos quem “produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente”. A pena é a mesma para quem vender ou expuser esse material. A lei prevê aumento da pena em um terço se o réu estiver no exercício de cargo ou função pública, tiver vínculo doméstico ou parentesco até o terceiro grau com a vítima.

CRIMES DE PEDOFILIA CRESCEM EM TERESINA

Dos aproximadamente 700 casos de violência contra crianças e adolescentes registrados anualmente em Teresina, ao menos 100 (aproximadamente 15%) do total, envolvem acusações de pedofilia. A cada semana há, em média, de dois a três denúncias do tipo.

Isso não quer dizer que as denúncias virem inquérito, já que passam primeiro por sistemas de investigação e depois oitiva de testemunhas, para, aí sim, virar uma peça policial para ser enviada à Justiça.

Aproximadamente 15% dos casos contra crianças e adolescentes registrados em Teresina são de crimes de pedofilia. Foto: João Alberto / O Olho.


A delegada responsável pela DPCA, Kátia Esteves, após três visitas e pedidos de entrevista da reportagem de O Olho mandou avisar via subordinados que  não fala com a imprensa. Ela designou um dos auxiliares para conversar sobre os casos.

O chefe de investigação da DPCA, Marlon Lima, disse que os casos têm aumentado, principalmente por dois fatores: o maior uso de instrumentos de Internet por parte dos pedófilos e o menor controle por parte dos pais. Sendo que há uma fácil disseminação e até apologia, para que crianças e adolescentes tirem fotos semi-nuas ou totalmente despidas, principalmente usando sistemas de compartilhamento.

“Muitas nem sabem que isso pode acabar com sua vida e fazem esses compartilhamentos por brincadeira, passando apenas para pessoas do ciclo de amizade. Mas isso chega fácil a outros círculos”.

Depois da popularização do aplicativo Whatsapp, segundo Marlon Lima, esse tipo de crime se tornou mais comum, pior e mais difícil de ser investigado por conta da rapidez que o crime é disseminado.

VÍTIMAS SÃO OFENDIDAS ATÉ DENTRO DA DELEGACIA E NA FRENTE DE POLICIAIS

A ousadia dos pedófilos que agem no Piauí (na Internet e pessoalmente) é tão grande que muitos, segundo o chefe de investigação da DPCA, chegam a ofender e culpar as vítimas na frente da delegada ou de policiais.

Geralmente, por não haver flagrante, já que os casos só são denunciados tempos depois de ocorrido, os pedófilos são intimados a depor da sede da DPCA, no bairro Redenção (zona Sul de Teresina).

Alguns deles, acompanhados de advogados, vêm armados de discursos de que eles são as vítimas e não as crianças e adolescentes.

Cada maço de papel sobre a mesa é um caso novo (de um único dia) envolvendo crianças e adolescentes em Teresina. Foto: João Alberto / O Olho
“Alguns agridem verbalmente as crianças na nossa frente. Dizem que elas fizeram porque quiseram”, relatou o chefe de investigação.

Outro ponto destacado é que muitas vezes a família vem registrar um caso de pedofilia e, por envolver membros dos círculos familiares a fraternais da vítima, terminam recebendo pressão dos acusados e acabam por retirar as queixas ou dificultam novas apurações.

Indagado porque os acusados fazem tanto isso Marlon Lima diz que muitos são verdadeiros monstros e que pessoas do tipo não contam conversa sobre acharem que estão corretas ou que o crime cometido é normal. “Aproximadamente 70% dos crimes de pedofilia no Piauí são cometidos por pessoas do ciclo familiar das vítimas, principalmente padrastos”, revelou Marlon Lima.

XERIFE CAÇA-PEDÓFILOS DÁ ALERTA AOS PAIS E RESPONSÁVEIS POR CRIANÇAS

“Se conselho fosse bom a gente não dava, vendia. Mas não canso de dar conselhos aos pais”, falou Marlon Lima, entremeio à quase dez investigações de crimes contra crianças e adolescentes somente esta semana.

O chefe de investigação da delegacia responsável por apurar crimes de pedofilia no Piauí destaca três pontos básicos a fazerem parte da vida dos pais e responsáveis por crianças. Em tempos de uso massivo de Internet e comportamentos quase sem limites os conselhos são imprescindíveis, principalmente porque são dados por alguém acostumado a lidar com o que há de pior vitimando crianças e adolescentes na capital do estado.

Com experiência de 15 anos como policial, sendo quatro somente na Delegacia do Menor, e dois meses sendo “xerife” caça-pedófilos, Marlon Lima fala que o primeiro desses pontos é sobre o uso de smartphones (telefones celulares com acesso à Internet, dentre outras funções) para crianças. “Não dê um aparelho desses antes delas completarem 14 anos. Antes dessa idade muitas vezes eles não têm discernimento do que é certo e do que é errado e são alvos fáceis”.

Crimes de pedofilia no Piauí
O segundo ponto é que os pais tenham controle sobre o uso da Internet por parte dos filhos. E quando fala em controle o chefe de investigação fala em monitoramento, ou seja, que os pais saibam realmente por quais sites navegam os filhos. “Muitos são vítimas de sites pornôs e depois de estar lá fica complicado tirar”.

O terceiro alerta reside na questão da educação e dos valores familiares, sendo que muitas vezes os próprios pais dão exemplos negativos para os filhos. “Deve haver mais limites e busca de valores. O mundo tecnológico invadiu a intimidade das pessoas, até das crianças. Isso só facilita a ação de pedófilos”, concluiu, pedindo licença para resolver mais dois casos de denúncia de pedofilia em Teresina.

“Aqui não pára”, finalizou o chefe de investigação.

A reportagem de O Olho visitou a DPCA três vezes. Na última vez foi durante uma manhã. Já haviam mais de cinco casos para serem apurados somente naquele período.

Portal O Olho

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