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Biden derrota Trump e vence eleições nos Estados Unidos

Os EUA escolhem, assim, Biden como o 46º presidente de sua história, depois de o democrata derrotar Donald Trump numa disputa histórica e acirrada

07/11/2020 | Redação
Joseph Robinette Biden Jr., 77 / Foto: Pedro Ladeira/Folhapress

Se tivesse calculado, talvez não fosse tão simbólico. Joseph Robinette Biden Jr., 77, foi declarado presidente eleito dos Estados Unidos neste sábado (7), segundo projeção da rede de notícias CNN, na semana em que completou 50 anos desde a primeira vez que assumiu um cargo político.

Os EUA escolhem, assim, Biden como o 46º presidente de sua história, depois de o democrata derrotar Donald Trump numa disputa histórica e acirrada, que o atual líder americano decidiu levar à Justiça.

Antes mesmo de haver um resultado final, o republicano se declarou vencedor da eleição e disse que iria à Suprema Corte para interromper a contagem de votos -com o temor de que aqueles enviados por correio, de maioria democrata, virassem o jogo em estados-chave, como de fato aconteceu.

Trump entrou com ações judiciais em Geórgia, Michigan, Wisconsin e Pensilvânia. Obteve vitória parcial na Pensilvânia e três derrotas, uma da quais também na Pensilvânia, e as outras em Geórgia e Michigan.

Em Wisconsin, onde o democrata venceu com menos de 1 ponto percentual de diferença, o atual presidente pediu recontagem dos votos, alegando, sem apresentar provas, que o voto postal gera fraudes.

A projeção da vitória de Biden veio com os resultados na Pensilvânia, estado que os democratas perderam para Trump em 2016 e que foi reconquistado neste ano.

Assim, o agora presidente eleito atingiu ao menos 273 votos no Colégio Eleitoral, acima do mínimo de 270, enquanto o candidato republicano conquistou, até o momento, 214.

Em relação ao apoio popular, Biden registra mais de 74 milhões de votos, recorde nos Estados Unidos e um marco num país onde a participação não é obrigatória. Trump, por sua vez, contabiliza ao menos 70 milhões de apoios na 59ª eleição presidencial americana desde 1788.

Em 4 de novembro de 1970, Biden assumia uma cadeira no conselho do condado de New Castle, em Delaware, espécie de Câmara de Vereadores. Meio século depois, vence a corrida à Casa Branca como o presidente mais velho a tomar posse –terá 78 anos na cerimônia de 20 de janeiro.

A noite da eleição, na terça (3), começou com a expectativa de que Biden superaria Trump com ampla vantagem, mas o republicano ganhou a decisiva Flórida e iniciou uma ilusão vermelha inicial, com uma série de triunfos e lideranças em estados-chave, o que manteve as chances de reeleição.

Ao vencer no Texas, em Iowa e em Ohio durante a madrugada de quarta (4), Trump fez muitos apoiadores de Biden temerem uma repetição de 2016, quando o presidente derrotou Hillary Clinton ao vencer na maior parte das regiões decisivas, contrariando as pesquisas.

Os levantamentos, aliás, novamente subestimaram o voto no republicano, que teve mais apoio do que o esperado entre latinos no Sul e no geral no Meio-Oeste –região crucial para sua vitória há quatro anos.
Já a liderança inicial em estados que depois seriam conquistados por Biden pode ser explicada pelo fato de que muitas regiões contabilizam o voto presencial –que favoreceu o republicano– antes dos votos antecipados, que incluem as cédulas enviadas pelo correio, em sua maioria de eleitores democratas.

Em Michigan e Wisconsin, por exemplo, Biden ultrapassou Trump conforme os votos por correspondência eram contados, principalmente nas grandes cidades, geralmente mais progressistas. Devido à pandemia, mais de 100 milhões votaram de forma antecipada, cerca de dois terços deles pelo serviço postal.

Como presidente, o desafio inicial do ex-vice de Barack Obama será controlar a crise sanitária que colocou os EUA como líderes em números de mortes e diagnósticos de Covid-19, enquanto administra as diversas alas de um Partido Democrata que se uniu para barrar Trump, mas que deve reviver diferenças no governo.

Biden saiu de uma pré-campanha desacreditada, no início do ano, com resultados frustrantes nas primárias de Iowa, New Hampshire e Nevada, para ser nomeado o candidato democrata.
Depois de uma vitória arrebatadora nas primárias da Carolina do Sul, no fim de fevereiro, fidelizou o eleitorado negro e ressurgiu como a principal aposta contra Trump.

Consolidou-se como alternativa a Bernie Sanders, senador progressista e principal rival no duelo interno pela nomeação, e uniu o centro democrata em uma articulação bem montada, que começou com a desistência de rivais às vésperas da Superterça, em março, até Sanders abrir mão da corrida, em abril.

Biden fez um campanha focada em Trump e nos erros do presidente no combate à pandemia. Apresentava-se como o único líder capaz de unir um país dividido pelo republicano, em meio a uma crise que deixou ao menos 236 mil mortos e 11,1 milhões de desempregados.

Assim, tentava cristalizar um sentimento mais anti-Trump do que pró-Biden entre fatias decisivas do eleitorado. Não era preciso gostar de Biden, diziam auxiliares do democrata. Bastava não gostar de Trump.

A narrativa da campanha democrata era de que Biden, segundo presidente católico dos EUA, depois de Kennedy, conseguiu se reerguer mesmo depois de ter perdido a primeira mulher e uma filha num acidente de carro em 1972 e, quatro décadas depois, outro filho, vítima de câncer no cérebro.

Com experiência e empatia com a dor do povo americano, argumentava, poderia reconstruir os EUA em um de seus momentos de maior dificuldade.

A partir de janeiro, Biden precisa mostrar que é possível colocar seu plano em prática diante do aumento dos casos de Covid-19 nos EUA. Um dia após a votação, o país registrou o maior índice de contaminação diária desde o início da pandemia: 100 mil casos, sinalizando que os EUA estão longe de controlar o vírus.

Além de combater a crise sanitária, o democrata precisa trabalhar em um pacote de estímulo econômico.

Em seus discursos, tem dito que vai "acabar com o vírus" e não "fechar o país". Também promete restaurar a normalidade e a confiança nas instituições americanas em um país polarizado. Em busca da reeleição, Trump colocou a democracia dos EUA sob seu maior teste de estresse desde a Guerra Civil, entre 1861 e 1865, quando estados do Sul lutaram contra os do Norte pela manutenção da escravidão no país.

O republicano deslegitimou o processo eleitoral e usou o governo para atender suas vontades e tentar garantir sua reeleição, em manobras que incluíram interferência estrangeira e pressão a funcionários e autarquias do Executivo. Apesar de derrotado, Trump permanece como uma força política importante.

Uma mostra dessa força é que Biden foi o primeiro presidente desde John F. Kennedy, em 1960, a se eleger sem conquistar os estados de Ohio e Flórida, e projeções indicam que o Senado deve seguir com maioria republicana. Na Câmara, a margem democrata perdeu fôlego, frustrando expectativas do partido.

Trump também trabalhou por quatro anos para moldar o Judiciário americano e nomeou mais de 200 juízes federais e três nomes à Suprema Corte, ampliando a maioria conservadora na corte. As decisões da instância máxima da Justiça nos EUA seguirão decisivas mesmo sob um governo democrata.

No plano global, a derrota de Trump, apenas o terceiro titular eleito a não conseguir um segundo mandato nos EUA desde a Segunda Guerra, é um aviso a populistas autoritários em todo o mundo, com Jair Bolsonaro à frente. O brasileiro desenhou um alinhamento total com o republicano, e agora terá de lidar com um democrata que já o criticou devido às queimadas na Amazônia.

Diante da polarização incentivada por Trump, o temor era que protestos violentos tomassem as ruas de várias cidades no dia da eleição e também depois da divulgação do resultado. No domingo (31), a três dias do pleito, estabelecimentos comerciais da capital Washington reforçaram a proteção de suas portas e janelas, com tapumes e outras medidas de segurança, principalmente nas cercanias da Casa Branca.

A partir de agora, Biden inicia a montagem de uma equipe de transição, mas as especulações sobre quem será nomeado começaram há dias, conforme sua liderança se mantinha consolidada nas pesquisas.

A senadora Elizabeth Warren, que foi pré-candidata democrata à Casa Branca e se tornou uma das principais conselheiras de Biden, pode assumir um posto da área econômica. Pete Buttigieg, que também concorreu às primárias, pode ficar com um dos postos com influência militar –ele é veterano.

Os dois representam alas diferentes do partido e mostram o desafio que Biden terá para tentar acomodar as correntes internas. Sanders e a estrela democrata Alexandria Ocasio-Cortez, por exemplo, integram um campo ainda mais à esquerda que Warren, por exemplo, e têm influência sobre parte importante da sigla.

Biden formou uma agenda de campanha que incorporou planos bastante progressistas. Agora é preciso saber até onde ele vai como presidente para implementá-los.

Quando terminar o mandato, o democrata terá 82 anos. Ele mesmo já se descreveu como um "presidente de transição", e a escolha da senadora Kamala Harris, 56, que agora se torna a primeira mulher negra e de ascendência asiática a assumir a Vice-Presidência americana, desponta para o futuro –em 2024.


MARINA DIAS
FOLHAPRESS (WILMINGTON, DELAWARE, EUA) 

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