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Gilmar Mendes anula decisão do CNJ e determina que juiz do PI volte ao cargo

Na punição do TJ/PI o juiz ficava em indisponibilidade pelo período de dois anos.

21/09/2019 | Edivan Araujo
Ministro Gilmar Mendes / Foto: Nelson Jr / SCO / STF

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu anular a revisão de pena do juiz Lirton Nogueira Santos, que foi acusado de fraude na expedição de alvarás enquanto trabalhava no Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de Campo Maior, a 84 km de Teresina. Com a decisão, o juiz, que estava afastado do cargo, volta a exercer suas atividades.

A punição anulada por Gilmar Mendes agravava a pena de censura que havia sido dada pelo Tribunal de Justiça do Piauí, transformando-a em pena de disponibilidade por dois anos, conforme decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

A pena de censura - dada pelo TJ - não afasta o juiz do cargo, apenas impede promoções na carreira. A pena de disponibilidade - dada pelo CNJ - afasta Lirton Nogueira por esse período de dois anos, mas com remuneração proporcional ao tempo trabalhado.

Entenda o caso

A investigação contra Lirton Nogueira foi iniciada a partir de solicitação feita pela juíza titular, Elvanice Pereira de Sousa Frota Gomes, que relatou a ocorrência de irregularidades, como fraudes na expedição de alvarás. A denúncia apontava morosidade de 93% na análise de processos, desaparecimento de autos e bloqueios judiciais irregulares.

Em sua defesa, o juiz alegou não ter relação com as faltas cometidas e que um funcionário subordinado a ele hackeou sua senha e, assim, respondia pelo magistrado nos processos.

Uma correição empreendida pela Corregedoria do TJPI em 2013 concluiu que o "Juizado Especial Cível da Comarca de Campo Maior foi usado, por uma quadrilha especializada, para lesionar empresas e o sistema financeiro nacional, aproveitando-se da boa-fé de pessoas inocentes, denegrindo a imagem da Justiça piauiense".

Irregularidades encontradas na Comarca

A investigação constatou uma série de irregularidades, como a morosidade injustificada na tramitação de processos, já que 93% dos processos físicos e 68% dos virtuais se encontravam em atraso no juizado. Também foi verificada a recusa ao acesso à certidão negativa e aos autos do processo a uma empresa do estado.

Outra irregularidade constatada foi o desaparecimento de 78 processos nos quais haviam sido determinados bloqueios judiciais que superavam R$ 2,4 milhões. Também foram identificados três processos que foram arquivados irregularmente, já que haviam recursos interpostos que nunca foram encaminhados para as Turmas Recursais do TJPI.

Além disso, foram apurados inúmeros bloqueios judiciais irregulares com problemas como: bloqueio efetivado em processo inexistente; deferimento de multa sem a comprovação de descumprimento de decisão judicial; ausência de intimação do executado sobre penhora realizada; e expedição de alvarás em nome de pessoas estranhas ao processo.

Punição do TJ

Diante do resultado da correição, o Tribunal Pleno do TJPI decidiu que a pena a ser aplicada ao magistrado seria de censura. Como o prazo para tal punição já estaria prescrito, os desembargadores piauienses decidiram pelo arquivamento, em 2015 - cerca de dois anos após a denúncia. Ou seja, o juiz não precisaria cumprir nenhum tipo de pena.

Denúncia da corregedoria

Para a corregedora Nancy Andrighi a pena era incompatível com a gravidade dos fatos encontrados e entendeu que deveria haver uma revisão disciplinar do caso. Ela propôs essa revisão ao CNJ.

"Embora tenha sido realizada detida análise dos fatos imputados ao juiz requerido, a pena de censura proposta, a qual estaria alcançada pelo fenômeno da prescrição, revela-se incompatível à gravidade das infrações perpetradas pelo juiz requerido", alegou a corregedora, à época.

Foto: Luiz Silveira / Agência CNJ

Registro da sessão que condenou o juiz do Piauí a disponibilidade por dois anos.

 

Decisão do CNJ

Por unanimidade, em junho de 2016, o Plenário do CNJ decidiu instaurar a Revisão Disciplinar de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra o juiz Lirton Nogueira Santos, do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí (TJPI), arquivado pelo Tribunal, para verificar "se o arquivamento foi adequado à hipótese dos autos".

Em 2018, o Plenário do CNJ decidiu, em votação por maioria, aplicar a pena de disponibilidade ao magistrado do Piauí. A relatora foi a conselheira Daldice Santana. O corregedor Nacional de Justiça João Otávio de Noronha, ao acompanhar o voto de Daldice, reforçou a gravidade das faltas apresentadas.

“Os fatos nos dão conta de um profissional negligente, indulgente e indolente. Ele não sabe o que acontece com os processos que tramitam lá em ponto de arquivar processo com recurso interposto, não sabe o que acontece com os bloqueios e tem 93% de morosidade”, listou Noronha.

Com essa decisão, o juiz foi afastado do cargo, mas recebendo salário. Dias antes, Lirton Nogueira havia sido empossado como Juiz Auxiliar da Comarca de Teresina.

Decisão de Gilmar Mendes

A decisão do ministro Gilmar Mendes determina que o magistrado volte ao cargo. O ministro considerou que o CNJ fez a revisão de pena fora do prazo limite, que é de até um ano após a decisão do TJ.

Na decisão, Gilmar destaca que o julgamento proferido pelo Pleno do tribunal de Justiça do Piauí, que determinou o arquivamento do Processo Administrativo Disciplinar, ocorreu em 26/02/2015, tendo sido o CNJ cientificado do resultado do julgamento dois meses depois.

A Corregedora Nacional de Justiça, por sua vez, oficiou, em 7/05/2015, à Corregedoria do TJ/PI para que encaminhasse cópia da decisão de arquivamento. O Corregedor Geral de Justiça do TJPI, em 9/06/2015, encaminhou o inteiro teor da decisão que determinou o arquivamento.

Neste contexto, o Plenário Virtual do CNJ, em 24/05/2016, ao apreciar o processo, por unanimidade, decidiu pela instauração de revisão disciplinar, que teve resultado em 30/05/2016, depois, portanto, do decurso do prazo decadencial de 1 ano, previsto na Constituição.

"Posto isso, concedo a segurança e julgo prejudicado o agravo regimental, em face do decurso do prazo decadencial, uma vez que a instauração da revisão disciplinar (termo ad quem, no caso) se verificou em 24/05/2015, com intimação do impetrante somente em 30/05/2015", finaliza o magistrado, em decisão publicada na última quinta-feira.

Jordana Cury

Cidadeverde 

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